domingo, 11 de julho de 2010

Um dia não são dias..

Amanhece! Discretamente, o sol rompe pelas ranhuras da persiana. A sua luz toca-me nos olhos, e muito suavemente vou acordando. Mais um dia começa! Um novo despertar cheio de supresas. O que este novo dia me trará? A dúvida invade a minha paz, e de repente, acordo! Abro os olhos, e olho em meu redor. O que há poucas horas era um quarto sem luz, escuro e sombrio, agora se transforma no mais radiante dos lugares. O único onde verdadeiramente me sinto dono e senhor de mim próprio. Mas não por muito tempo.
Sem ter consciência do que me espera, levanto-me, faço todos os preparativos para a saída daquele lugar pacífico, sereno, e enfrento o mundo lá fora sem medo! Eu vou!
O pequeno-almoço é o costume: uma tigela de cereais com leite. A televisão mostra as desgraças que se passam no mundo. E estão cada vez mais perto de mim! Não posso desanimar e desistir assim tão facilmente, e por isso continuo com o planeado: Sair de casa!
No estacionamento, o vizinho, à pressa para as suas responsabilidades, coloca o filho no carro, põe-lhe o cinto, fecha a porta, dá a volta, entra no carro e abala, mas não sem antes me acenar com a cabeça, como quem diz "Bom dia". Eu respondo e continuo caminho para o meu carro que me espera, impacientemente, desejoso de sair do sítio onde passou mais uma friorenta noite de Inverno. Entro no carro, e antes de fechar a porta, a minha vizinha: "Bom dia, vizinho!". "Bom dia, vizinha!", respondo com um sorriso em resposta ao simpático e aparentemente sincero sorriso dela.
Mas espera! Também eu tenho uma filha. Que faço eu aqui? Há que voltar atrás, ir buscá-la, e levá-la à escola.
Aborrece-me imenso ir trabalhar, há outros assuntos pendentes, mas não há como fugir. Tem de ser! E lá vou eu!

Café!! A 'Sabelinha, que trabalha no café do Sr. Antunes, tira uns esplêndidos cafés, e é lá que vou antes das responsabilidades. Aquele sítio é como muitos outros, mas uma pessoa habitua-se aos sons, às caras, vozes, cheiros... É imperdível o som do moinho de café a moer os grãos, aquele cheiro, as vozes dos clientes: "Bom dia. É um café, por favor!", ou a Sabelinha: "Bom dia, Sr. Zé. É o costume?".
Bebo o meu! Leio os títulos do jornal. Acompanho com um cigarro - Vivam os extractores de fumo! - Infelizmente, acordo para a realidade e ponho-me a caminho do inevitável, por muito que custe.
A estrada reflecte uma dolorosa claridade. Havia chovido durante a noite. Na berma da estrada dois carros batidos num aparatoso acidente. Será que alguém ficou mal? Mesmo que não me interessasse, sou obrigado a olhar, porque não há ninguém que não goste de assistir a uma pequena desgraça logo de manhã, para despertar. Desde que seja a dos outros! E olho. Os intervenientes do acidente encontram-se bem de saúde. Bem demais! Tenho os vidros fechados e a música ligeiramente estridente, mas mesmo assim ouço os gritos de um em direcção ao outro, e vice-versa. Cada um deles atribui culpas ao outro, e assim continuam enquanto me afasto, lentamente, até porque não me deixam ir mais depressa. Cambada de curiosos sem vida própria!
O dia de trabalho começa sem novidades. As mesmas pessoas, o mesmo computador, os mesmo softwares, o mesmo tudo. Só a data ao canto do monitor me informa que algo está diferente.

São oito. São oito as horas que passam, por vezes devagar, outras mais depressa, o que não deixa de ser bom. No entanto, sem me dar conta, já tenho 30 anos e ainda ontem tinha 21.
Vou para casa, mas não sem antes passar pelo infantário buscar a míuda. Ali sim, é a azáfama da hora de saída. Todas aquelas crianças aos gritos, aos saltos, a brincar. Renova-me a esperança que um dia as coisas serão melhores, mais fáceis, mais simples, que algum dia foram para mim.
Não me considero um azarado, mas há certas coisas que não são fáceis, talvez para todos, mas eu não sou todos. Eu sou eu! A minha educação obriga-me a engolir sapos do tamanho de bois, mas não devia. Enfim... Levo a míuda à casa da mãe que é com ela que ele vive. Longe de mim separar uma criança da melhor coisa que pode ter: a mãe! Deixo-a lá e regresso à minha solidão. Tenho família e amigos. Posso sempre, depois do jantar, ir beber um café com alguns amigos, mas será suficiente?
Janto com a companhia do computador - engraçado como a evolução é. Há 60 anos a companhia de alguém era o parceiro ou parceira, desde há 20 anos que é a televisão e, hoje em dia, o computador. Há o YouTube, as séries online, o Messenger, o Facebook... - Converso com alguns amigos e aí combino o café.

Saio de casa, mais uma vez encontro vizinhos pelo caminho. "Boa noite, vizinho!". "Boa noite!". Sempre com sorrisos de orelha a orelha que rapidamente se desfazem ao se afastarem. Não que se desgostem, mas também não há do que gostar, não nos conhecemos...
Lá fora chove desde o meio da tarde. Já há muitas horas que é de noite, mesmo que o telemóvel ainda marque 20h30. Apressadamente dirigo-me ao carro, abro a porta, entro. Fiquei completamente encharcado. Sacudo-me e coloco a chave na ignição. - Uma coisa muito importante dentro de um carro de um homem: a música! Tem de haver sempre música dentro do carro, senão a depressão instala-se, e até deixava de ver a estrada.
Estaciono em local proíbido, mas o mais perto possível do bar onde nos vamos encontrar: eu, três amigos, e... ela! Ela vai lá estar. Havia confirmado a sua presença pouco antes de sair de casa, o que me deu mais algum ânimo e vontade de enfrentar a violência do vento e chuva que insiste em não cessar, causando pânico e distruição à minha volta. Mas sou egoísta e egocêntrico, e o sofrimento dos outros a mim pouco me diz. Já tenho o meu... Mesmo que não o seja, parece-me mais grave ainda.

Entro no bar. Pareço um pinto, o que me torna ainda mais sexy aos seus olhos, mesmo que a boca nada diga. Cumprimento toda a gente e sento-me à sua frente, mas não directamente. Isso seria muito mais constrangedor, dadas as circunstâncias. O namorado dela está ao seu lado e agarra-lhe a mão ainda com mais força à medida que me aproximo. Ouço o que conversam e começo a participar, lançamos piadas, rimos todos. Nenhum de nós sabe a infelicidade de vida que cada um dos outros tem, mas isso ali não é importante. O importante é o convívio e a boa disposição. Aquele curtíssimo espaço de tempo serve de escape à dura realidade que enfrentamos. Quando estamos ali, não queremos saber dos problemas dos outros, nem que os outros saibam dos nossos. Ali é para rir e falar de banalidades.
De repente sinto algo. O que é isto? Doi, mas... é bom! Sabe tão bem, mas... magoa! Um olhar perfurante, sensual... É discreto para todos menos para mim. É um desejo tornado realidade. Será? Será possível que ela esteja "de olho" em mim? Devolvo o olhar, mas não por muito tempo. Aquilo não pode estar a acontecer.

Um café, uma água das Pedras e três imperiais depois, estamos prontos para sair dali, e rumar aos respectivos lares. Despedimo-nos uns dos outros muito rapidamente, excepto... Quando nos vamos despedir com os  tradicionais dois beijos na face, demoramos mais tempo que o que seria normal, e ali ficamos, só encostados. Parece uma eternidade, no entanto passa tão depressa. Depressa demais. E acaba. Afastamo-nos em direcção aos carros e, quando estou a abrir a porta do meu, ouço o meu nome. É ela, e vem a correr para mim. O meu coração dispara e acelera para além do meu controlo. Os cantos da minha boca vão-se elevando, formando uma espécie de sorriso, num misto de felicidade e terror. Vê-la dirigir-se na minha direcção faz-me imaginar tudo aquilo que já havia desejado vezes e vezes sem conta. Um beijo! Um longo e molhado beijo entre nós. Antes de parar a sua marcha, ela abranda o passo, estica a mão direita, mas como está escuro, não percebo porquê. Penso que poderá querer abraçar-me, mas... Será? No que se aproxima diz: "Esqueceste-te do telemóvel". - Nas animações vê-se a personagem com um balão de pensamento a pairar por cima da cabeça, com a imagem desejada. À face da desilução, o balão desvanece-se. Assim foi comigo. Esbocei o mais forçado dos sorrisos alguma vez visto e agradeci-lhe, enquanto o contacto visual se mantinha. E manteve-se durante o que pareceu horas. Aqueles olhos verdes contornados a preto, as longas pestanas, as sobrancelhas tão lindas e bem arranjadas... Tudo à volta desapareceu, a minha visão afunilou para os mais lindos olhos alguma vez vistos, deixei de ouvir qualquer tipo de som ou ver qualquer tipo de imagem à minha volta. Só os olhos dela! Os carros passavam, mas só o sei porque já os tinha visto a descer a rua. De repente foi o nome dela que ouvi ao fundo do túnel, muito baixinho e, comecei a despertar. Outra vez o nome dela. Mas que raio?!!? Desta vez um pouco mais perto. À terceira foi de vez e ouvi a realidade daquele som que teimava em ser ouvido. Era o namorado dela que a chamava aos gritos no meio da rua, bem audível. Toquei-lhe no ombro e disse que tinha de ir. Também ela despertou do transe em que se encontrava, despediu-se com uma expressão de felicidade no olhar e afastou-se. Este foi sem dúvida, o momento mais constrangedor, alegre, feliz, assustador, aterrador, petrificante da minha vida.

Entro no carro, dou à chave, ligo o auto-rádio e vou-me. Cedo aquele acontecimento inunda a minha consciência, e fico a pensar no sucedido. Mas eu não quero pensar naquilo. É uma fantasia. Uma linda fantasia, mas sem o deixar de ser. Quero não pensar. Levanto o som. Ainda não chega. Mais um bocado. Não! Ainda não. Mais, e mais, e mais, e mais, e mais... Até que já não noto diferença entre a música e o rasgar das colunas. O auto-rádio não dá mais, as colunas saltam das portas da frente e a chapeleira dos carro dança. Quer dizer, dançar não dança. Salta, toca no tecto do carro e volta para baixo, só para fazer o mesmo trajecto de novo. Aqueles olhos não me saiem da cabeça, então desisto. Momentos antes de me rebentarem os tímpanos, baixo o volume, e vou para casa a apreciar a música que me acompanha nas minha viagens, e a pensar na beleza feminina que me acompanhou numa noite de amizades, mesmo que ela própria acompanhada. E, apesar de tudo, sabe bem!

NOTA: Todo o conteúdo deste blog é da responsabilidade de um conjunto alargado de pessoas e respectivas atitudes, que sem muito esforço, conseguiram enlouquecer por completo o autor, provocando uma série de devaneios sem nexo, sem lógica e, definitivamente sem nenhuma razão de ser.

7 comentários:

Anónimo disse...

lindo....

Anónimo disse...

lindo...............:)

Anónimo disse...

É verdade?

Ass:Catarina Martins

Joel Santinho disse...

o quê?

Anónimo disse...

Oh Joel, o que escreveste aqui,,, é verdade?

Ass: Catarina Martins

Joel Santinho disse...

Não. é ficção!!!! Independentemente de conhecer raparigas de olhos verdes ou não. Isto não se passou a não ser na minha mente perturbada enquanto escrevia o texto. :)

Anónimo disse...

pena...pensei que fosse verdade...se assim fosse seria lindo....